domingo, dezembro 26, 2010

mulher no fim do ano, mulher no fim do mês.

Mulher é de Lua, mulher ninguém entende. Eu tô cansada de ter que me assumir como mau humorada para que entendam que eu não tenho a menor paciência para a grande maioria das coisas. Mas tem dia que é pior, e não é só (mas pode ser) tpm. Tem dia, tenho a impressão, que eu acordo com os olhos mais abertos e noto que meu amigo genial fez merda, que minha mãe, tão doce, está azeda, que a cerveja não desce, e que meu namorado não tem um gosto tão diferente assim do da maioria dos homens. E que por mais que eu seja inteligente, às vezes eu preferia ser gostosa. Tem dia que, pelo contrário, eu acho tudo uma maravilha e irrito as pessoas com meu bom humor inabalável. Disseram que eu sou multipolar, mas eu acho que eu só sou mulher. Dessas mulheres que fazem uma semana de regime e estragam tudo com três dias de bebedeiras seguidas com os amigos. Dessas mulheres independentes de uma nova geração, tão livre, tão descolada que se sobrecarrega de tanta coisa e esquece de cuidar de si e maldiz, uma vez ou outra, a própria independência e liberdade. É fim de ano e toda mulher faz pelo menos uma resolução de ano novo. Eu fiz a minha: vou cuidar de mim e não dos meus três empregos, ou do mestrado, ou da amiga que tem um primo cujo vizinho perdeu a perna. Mulher acha que consegue cuidar de tudo. Eu sei, moro com cinco mulheres e, não bastassem os muitos problemas que cada uma tem, ficamos todas uma querendo salvar a outra e não percebendo que, se cada uma se cuidasse seríamos mais tranquilas. Mas menos parecidas com nós mesmas, não é? Porque, no fundo, por mais que a gente faça resolução de cuidar de si mesma, e passar creme no olho e malhar e se amar mais, a gente só se reconheço no abraço da amiga, nas calorias que a gente consome pra tomar uma cerveja com o amigo do primo do vizinho que terminou com a namorada, ou pra fazer uma jantarzinho gostoso pro namorado, mesmo sabendo que ele não engorda e você engordará pelos dois. Depois, pode ser, que seu amigo não te faça companhia se o primo do seu vizinho tiver terminado o namoro. Depois, pode ser, que seu namorado não se canse de achar meninas magérrimas bonitas, mesmo dizendo que você tá bem assim. Depois, pode ser, que você precise de um quarto ou quinto emprego. Mas tudo bem, porque você é mulher, multipolar e suporta tudo, com uma amiga, uma cerveja e todas as calorias que essa combinação acarreta. Vai abraçar o mundo, mulher. E no fim do próximo ano, vê se resolve cuidar mais de você...

quinta-feira, outubro 14, 2010

Eu choro muito, mas nem sempre é tristeza. Acho que eu sou filha de uma espécie de inquietação que fere os outros para pode continuar viva. Mas não faço de propósito. Às vezes o meu grito é tão forte e denso que ocupa a minha boca de um jeito que as palavras perdem seu espaço, e acabam saindo pelos olhos, transformadas em palavras líquidas, que não argumentam, mas quase sempre convencem. Às vezes eu fico pensando qual seria o jeito mais fácil de lhe convencer que não, eu não tô brava, eu só preciso que fique claro por ai, o que obscuro permanece aqui dentro. Tenho medo do que você pensa de mim, mais medo tenho que coincida com o que eu penso de mim mesma, que é tão terrível. E, ao mesmo tempo que acho que a distância é o que salva a nossa relação, eu tenho certeza de que longe de você é mais difícil trocar grito por palavras, palavras por lágrimas e lágrimas por desespero. Eu sei que lhe incomoda, mas eu preciso incomodar para sentir que eu continuo viva. Você me quer tranquila, me deseja paz e não percebe que é desse desespero que eu sou feita e que é nele, e só nele, que eu me identifico. Eu preciso transformar tudo que eu puder em palavra e as palavras em lágrimas para fazer algum sentido estar aqui, com você, com eles, com todo mundo.Se não fosse o desespero o mundo poderia continuar existendo sem a gente, você não entende? Se não fosse o desespero, eu diria tchau e não voltaria mais para o único lugar em que eu me sinto mais profundamente eu: ao seu lado.

segunda-feira, setembro 13, 2010

É como se eu estivesse presa em mim mesma, conseguindo tocar  as quatro paredes que me cercam. Eu toco, mas não quebro: nem as paredes, nem a expectativa. O máximo que se destrói dentro de mim são os meus pulsos, esmurrando com uma frequência quase musical essa parede que me lembra o seu abraço, quase intocável e totalmente indestrutível. Eu ainda me incomodo muito com as minhas próprias unhas quando eu fecho as mãos, tentando segurar o que já não vejo. As unhas são as partes de mim que mais me identificam: assim escuras e longas elas prometem uma força que eu não tenho, mas que eu finjo muito bem. 

quarta-feira, julho 21, 2010

saudade

Você era a única da família que falava árabe tão bem quanto português e conseguia reunir o que tinha de melhor nos dois países…Faz um ano já que você partiu, eu queria tanto saber quando falar de você vai me doer menos. No fundo, fico pensando que eu não quero que doa menos, porque eu tenho medo de te esquecer. Antes de você ir embora, você já não tava aqui, eu sei, mas a ter a possibilidade de ainda te ver, a saudade de um tempo que voltaria é muito mais suportável e doce que essa distância intransponível. Eu uso seu perfume, eu não quero esquecer nunca seu cheiro e me prendo na certeza que vou te encontrar mais uma vez, em algum lugar onde o cheiro não importará mais. Foram poucas as vezes que estive contigo se comparadas ao amor que ainda sinto por você. Eu te reconheço em outros gestos e vejo a sua mão quando olha para as mãos da minha mãe. Eu hoje sinto saudade de você olhando para os outros: outras avós que não tem o seu abraço Eu queria ser mais parecida com você, infelizmente não nasci nem com seus olhos, nem com seu jeito de acalmar tudo, de fazer cafuné e de dar boa noite. A saudade que eu sinto me faz ter mais medo de continuar vivendo, mais medo de perder outras pessoas como eu te perdi. Arrependo-me tanto de não ter escrito mais cartas enquanto era apenas um mar, e não uma certeza – a da morte – que nos separava. Às vezes fico fingindo que você vai voltar, sabe? Queria te escrever um livro, dizendo tudo que eu senti e não disse. Eu chorava toda vez que você ia embora, e hoje tenho a impressão que nunca chorei o suficiente em cada partida sua. Eu poderia não ter escrito isso e você teria lido, porque eu sei que você tá do meu lado, sorrindo desconfiada do meu projeto de mestrado nada católico. Eu não sou brasileira nem libanesa, eu sou esse misto que me faz tão sua neta que até assim, de tão longe, você me reconheceria e sentiria um orgulho no jeito que eu escrevo ao contrário um alfabeto que para nós duas, e só pra nós duas, já nasceu meio torto.

quarta-feira, julho 07, 2010

Você teve um dia de merda e tudo deu errado. Clonaram seu cartão, sua aula foi um porre, você não tem nem um centavo na carteira. Tudo bem, pensando bem em dois dias você vai vê-lo e tudo fica bem de novo. Mas hoje, justo hoje, você teve que andar a mesma merda de caminho três vezes porque a burocracia não acabava, não conseguiu estudar e teve cólica. Você queria uma cerveja e um abraço, mas você não pode beber porque dói, e tua cama continua vazia. O dia não acabou e ainda faltam dois dias para que você ache os braços que tanto procura. Você só queria que o dia acabasse. Era inverno, porra, por que esse sol queimando suas costas que doem porque a mochila ta pesada com a compra da semana. Mas o dia se arrastava, sua aula não tinha nem começado e você ja tava pedindo arrego. A aula durou um curso inteiro e seus amigos te chamaram pra ir pro bar. Você foi como quem nada tem a fazer além de tentar sorrir: nem álcool, nem ele. Fazer o que ali?
Volta para casa e come, é a única serotonina que te resta pra hoje. Sua anta, colocou molho de tomate na comida, atacou a gastrite. Ok, vai jogar baralho para distrair a cabeça. Mas você ainda ta pensando nele. Azar no jogo, perdeu as três quedas. Você continua cansada e manda todo mundo embora pra dormir. dor dor dor, vai deitar, que o dia já acabou. O dia já acabou e o outro dia chegou, e você nem notou. Um dia que não se parece, nem um pouco com os outros dias. Falta só um dia para você ver quem faz aniversário hoje, um dia para voltar a fazer sentido o resto das coisas que não combinam com seu dia a dia. Falta um dia, você aguenta, eu sei. A saudade é que não...

domingo, março 14, 2010

minhas linhas, seus desenhos.

eu vou seguir guardando todos os seus desenhos. Todos. até aquele que você disse para eu não levar a sério. cada desenho que eu guardar, um pouco do que você tem de melhor fica comigo: um descarrego de cores e formas que saem pelas pontas do seu dedo e esvaziam sua cabeça, do jeito que você precisa.
eu guardo seus desenhos como uma espécie de masoquismo assustadoramente doce, porque eu sei que eu nunca vou ter a formas e nem as cores certas de um bom desenho e nem como folha de papel em braco eu sirvo, nasci assim, meio parda e manchada por algumas saudades de outras vidas não-vividas. Sabido disso, eu sigo guardando seus desenhos como forma de lembrar que você sabe, como um verdadeiro artista, redesenhar linhas e transformar qualquer flor murcha em uma verdadeira obra de arte

quarta-feira, março 10, 2010

Meu pedido de desculpas...

Queridos (poucos) leitores desse blog,

Eu venho pedir desculpa por tirar a possibilidade de publicar como "anônimo" nesse blog. Eu sei que muitos dos comentários lindos e mais recorrentes viam de pessoas que só escreviam o nome - real ou não. Eu adoro tudo, de coração. E me emociono toda vez que vejo totais desconhecidos em sintonia com o que eu escrevo e partilhando as mesmas sensações.
Entretanto, alguém com muito tempo livre (e com extrema falta de sexo) tem me ameaçado constantemente fazendo uso dessa opção. Aos outros, que nada tem com isso, meu pedido de desculpas.

Um beijo vermelho,

Rosa.

quinta-feira, fevereiro 25, 2010



E você que não quer mais sofrer divide sua vida em contos. E assim, todos os dias você vai ter a graça do começar de novo e o êxtase do fim. Nem todos os contos são bons, nem todos os finais surpreendentes. Nem todos a gente quer que acabe…
Às vezes virar a página dói, porque muda a história, muda o enredo, mudam os personagens. Noutras vezes te alivia…Você não podia mais entrar tão fundo naquela história.
A única coisa que um conto tem em comum com outro é ser curto. Facilitando a sua vida e deixando por aí pequenos prazeres e pequenas dores. Nenhum conto é longo o suficiente para te envolver mais  do que três lágrimas e alguns beijos esquecidos. Ela que não queria mais sofrer decidiu dividir a vida em contos, achou que assim daria certo. Ela, que não queria mais sofrer, notou que sua vida estava divididas em capítulos de um mesmo romance em que ela odiava ser protagonista.

quarta-feira, fevereiro 24, 2010

A gente sempre tem dois caminhos

Maria cresceu muito antes das amigas da turma. Menstruou muito antes que as colegas e aos doze anos já sabia abotoar o soutien nas costas. Não gostava de matemática, mas tirava a nota mais alta porque tinha escolhido ser a melhor aluna. Diferente das outras que ainda não tinham peito, escolheu que não gostava de se sentir presa. E assim, quando todo mundo já tinha soutien, Maria decidiu que não ia mais usar. A gente sempre tem dois caminhos e para alguns é muito mais fácil escolher o mais difícil. Maria, míope, não conseguiu ver que tinha dois caminhos e além de ser mais fácil foi inevitável escolher o mais difícil. No caminho mais difícil as regras eram fáceis: nunca esconder o que sente e sempre dizer a verdade. O caminho difícil, em sua facilidade, era o cruzamento mais forte da dor e do prazer. Para Maria, então, dor e prazer necessariamente andariam juntos. E quando, por acaso do destino, se separassem, a dor perceberia que havia se perdido do prazer e viria logo em seguida procurá-lo, avisando pra Maria e para o resto do mundo que um não fica sem o outro. No caminho difícil outrora escolhido a gente não pode mais voltar atrás e reencontrar o caminho fácil. Primeiro, porque a dificuldade do caminho difícil é justamente não ter atalho. Segundo, porque há qualquer coisa de viciante em optar pelo caminho difícil. Maria ainda não sabe se é o prazer ou é a dor. Talvez sejam os dois. Hoje ela entende: a gente sempre tem dois caminhos, mas só uma escolha.

domingo, fevereiro 21, 2010

Deitada ali só pensava em três coisas: que precisava descansar; que aquele cochilo tinha tempo limitado e que logo mais ia anoitecer. E de noite tudo fica diferente…
Conforme o sol descia e o céu azul ia mudando de tom, seu corpo em posição fetal ia se contorcendo, como se conforme o calor do sol diminuísse, seu corpo procurasse a única coisa passível de abraço naquele lugar: ele mesmo.
Assim, agarrou suas próprias pernas e dormiu com os olhos voltados para o joelho. Se aqueles olhos, que funcionavam como um oásis no deserto de olheiras, abrissem teriam como primeira vista a cicatriz do joelho da garota arteira que um ela dia tinha sido e da mulher exausta que, naquele momento, precisava de um cochilo, ainda que limitado.  A cicatriz insistia em lembrá-la da verdade que ela teimava em esquecer: que não só para o sol o tempo passa e o calor, necessariamente, diminui.
Entretanto, diferente do sol, ela não encontrava naqueles travesseiros nenhum consolo macio que lembrasse alguma nuvem. Nada a rodeava além do sono e do cansaço premeditado e típico dessa infeliz espécie humana que insiste em dormir pensando na hora de acordar.
Acordaria, evidentemente. Provavelmente com frio, certamente sem voz, enrolada com um pouco de dor nos próprios braços que também diferentes dos raios do sol não alcançavam muito mais que ela mesma…

terça-feira, fevereiro 16, 2010

É verdade que tem hora que cai bem o desrespeito. Cai bem porque ofende menos que o silêncio e incomoda tanto quanto a sua cara fitando a minha, dizendo: "minha cara..." e não sabendo, no fundo, o que queria dizer. Eu prefiro o desrespeito gritado em surdas palavras do que meias palavras que tendem a palavra alguma. É do desrespeito que as verdades se alimentam e verdade precisa, no fim, de força para acreditar-se verdade e atravessar o meu corpo para sair da minha boca. Eu alimento as minhas verdades diariamente. Eu as deixo fortes e prontas para superar qualquer ponta de insegurança que me desça goela abaixo. Elas sobem sobre tudo e deslizam pela minha língua lado a lado ao meu último gole de cerveja. Bebo verdades para depois vomitá-las. E eu sei que no fim elas são mãe e pai do meu desrespeito e filhas perdidas da minha vontade.

quarta-feira, janeiro 13, 2010

Assim, de papel.

Ser humano é uma folha de papel branca. A gente tem que sair por ai escrevendo nas pessoas; as pessoas. Tem gente que não sabe ser folha de papel, se fecha em capas limpas e não deixa ninguém encostar a caneta: gente que não gosta de ser história. Tem gente que prefere ser bloco de nota, tudo passageiro, tudo supérfluo, tudo para avisar, lembrar mas sem deixar memória. Eu escolhi ser só uma folha branca, solta. A mais branca que eu pudesse ser. Dessas que voam por aí em forma de aviãozinho e acabam sendo rabiscadas enquanto alguém fala no telefone. Gente tem que se deixar escrever, para nascer mais um livro nessa biblioteca torta e infinita que é a vida. A gente encontra por ai gente que é gibi, vive pequenas cenas, lindas e coloridas sem nenhuma trama complexa. Eu, no fundo, só fujo de quem foge da realidade de folha de papel e se espreme, espreme, espreme até virar uma bolinha. Pimba: com elas a gente faz uma cesta no lixo, com direito a comemoração. Tem gente que não quer e nem sabe ser folha. Mas não adianta:  ser humano, no fim, é uma folha de papel branca. Às vezes ela acaba suja, às vezes vira rascunho porém, inevitavelmente, todas são sem pauta, que é para gente poder escrever tudo torto: subindo e descendo as linhas que a gente teima em imaginar.

sexta-feira, janeiro 08, 2010

palavra dói.

Porque palavra, mesmo, tem que doer: sair rasgando os seus lábios, sendo dita com saliva e sangue. Palavra tem que consumir os dedos, coçar a palma da mão e sair, com esse comichão, fazer doer os olhos que lêem. Palavra tem que ser grito e sussuro, verdade e mentira, medo e coragem. Palavra é a única coisa capaz de fazer sentir ciúme, de fazer sentir raiva. Palavra machuca mais que beijo, mais que olhar. Palavra trai e perdoa. Palavra excita muito mais que o teu assopro no meu ouvido, muito mais que suas mãos suadas redesenhando meu corpo. Palavra repele, insinua, palavra mente. Mente, mente, mente. A mãe e o pai da mentira é palavra. O filhos da verdade também são palavras. Palavra não protege ninguém, não respeita nenhum sorriso, vem trazendo lágrima para tua felicidade. Palavra faz sofrer, dói, dói, tem que doer. Palavra quebra a coisa mais forte desse mundo: o silêncio.

sábado, janeiro 02, 2010

Eu sinto.

Ainda sai de minhas mãos, mesmo enquanto escrevo, o cheiro que tanto me lembra a sua boca quando suja de mim. Pego, hoje, nessa caneta como se segurasse o mundo entre os dedos, de modo que dessa caneta e, portanto, do mundo, pudesse desprender a verdade original, aquele motivo verdadeiramente autêntico: límpido. Há nesse cheiro o segredo da existência: minha, sua e de todos que acabaram afogados nos meus cabelos e perdidos na sua barba. E como se não fosse justo manter o cheiro, a caneta e o mundo só para mim, eu passo as mãos pelo seu nariz e pela sua boca, e peço que assim suas palavras cantadas, sussuradas e repetidas levem esse cheiro para todos que cruzaram por mim, pelas suas pernas e pelas nossas sombras. Da caneta e por isso do mundo sairão as palavras disformes, filhas do nosso cheiro: é assim, e só assim que o mundo pode ser (d)escrito.